Crítica de mídia: Felipe Melo e a masculinidade tóxica no futebol  

Por: Lucas Sant’Ana (@lucas35zzz) e Raul Machado (@raulzzz)

Flickr Fluminense / MAILSON SANTANA

O começo

Felipe Melo de Carvalho, carioca de 40 anos, iniciou a trajetória no futebol no Flamengo em 2003 e em pouco tempo transferiu-se para a Europa, onde passou a maior parte da carreira.

Após boas atuações em solo estrangeiro, Melo começou a ser convocado para a Seleção Brasileira e disputou a Copa do Mundo de 2010 como titular. Foi nesse período que o atleta ficou conhecido no país e chamou atenção de todos por seu estilo. 

Cara de poucos amigos, brigador, entradas violentas e sem levar desaforo para casa. Muitos fãs de futebol valorizam bastante jogadores com essas características e por onde passava ele era de longe o mais efusivo da equipe. A primeira grande polêmica envolvendo violência foi justamente no mundial de 2010, em que Felipe, após dar um pisão em Arjen Robben, foi expulso e complicou a situação da seleção brasileira na partida. 

Mas qual o problema? 

A cultura futebolística tem raiz fortemente tradicional, no pior sentido da palavra. Quando analisamos o impacto que isso pode ter na formação da personalidade dos jovens envolvidos nesse meio, seja dentro de campo ou na arquibancada, em algumas situações, esses dogmas fomentam a reprodução e perpetuação de uma masculinidade tóxica. 

Na entrevista de apresentação no Palmeiras, uma fala do atleta repercutiu bastante na época: 

“Se tiver que dar porrada, eu vou dar porrada! Se tiver que jogar no Uruguai e dar tapa na cara de uruguaio, eu vou dar! Porque isso faz parte do meu estilo de jogar.”

Porém, Felipe não é um caso isolado no mundo do futebol. Jogadores como Pepe, Gattuso, Luis Fabiano, Sérgio Ramos, entre outros, são outros exemplos de futebolistas que foram muito exaltados durante o período que jogaram por não “afinarem” para ninguém.  

Até mesmo no futebol amador ou em jogos casuais, diversas confusões e pancadarias acontecem porque muitos homens sentem-se na necessidade de “defender” a honra quando entendem que foram desrespeitados pelo adversário. 

Nesse cenário, jogadores como Felipe Melo representam um ideal que vai além das quatro linhas. O jogador é abertamente conservador e faz questão de se posicionar politicamente em algumas ocasiões. 

Felipe Melo faz post em apoio a campanha de Bolsonaro

Imagem: Instagram(@felipemelo) / reprodução

Nas redes sociais, o jogador tenta construir uma imagem de homem de família, confiante e constantemente se compara ao cachorro da raça pitbull, apelido que o próprio atleta adotou para si próprio.

Felipe Melo posa com cachorro da raça pitbull

Imagem: Instagram (@felipemelo) / reprodução

Em outras publicações, fora do ambiente esportivo, Felipe se diferencia da estética dos demais jogadores por usar roupas mais sociais e formais em algumas ocasiões, aspecto que parece visar transmitir força e seriedade.

Felipe Melo faz post com roupa social

Imagem: Instagram(@felipemelo) / reprodução

Influência

Devido a personalidade intensa e longa carreira, o jogador foi capitão do Palmeiras em diversas situações na passagem pelo clube e claramente é uma figura respeitada dentro do Fluminense,  atual equipe do jogador. 

https://twitter.com/TN10Sincero/status/1710846969449435442?s=20: Crítica de mídia: Felipe Melo e a masculinidade tóxica no futebol  

Em um compilado de jogadas mais violentas e reações mais explosivas do atleta, é possível observar como muitos admiram a forma de jogar nos comentários.  

Comentários exaltando o estilo de jogo de Felipe

Imagem: Comentários no Youtube / reprodução

Contexto machista

Se considerarmos o que personagens como Felipe representam dentro e fora de campo, as posturas desses tipos de jogadores fomentam um cenário pouco receptivo a participação feminina nos mais diversos âmbitos. 

Na esfera do jornalismo, por exemplo, as mulheres conseguiram avançar bastante nos últimos anos no sentido de ocuparem espaços e postos de relevância na área do futebol e no esporte como um todo. Mesmo com algumas mudanças, que ainda são lentas, isso não apaga o fato de que esse universo ainda impõe vários tipos de violências com pessoas desse gênero.  

Um caso que evidencia isso foi a entrevista de Roger Guedes, ex-jogador do Corinthians, em que ele, ao falar do caso que envolve a condenação do técnico Cuca por violência sexual de uma menor, defendeu o ex-comandante dos comentários feitos pela mídia e criticou especificamente as falas da jornalista do SporTV Ana Thais Matos, que havia se posicionado sobre o caso. 

Por mais que Roger e Felipe tenham tido um desentendimento na época em que ambos atuaram pelo Palmeiras, eles têm vários comportamentos parecidos no que diz respeito ao conservadorismo. 

Além disso, são várias as outras situações em que a própria audiência crítica mais profissionais mulheres do que homens

Comentários criticando narradoras mulheres

Imagem: Comentários no Twitter/ reprodução

Os tempos são outros

Todos sabemos que o futebol não se resume apenas às quatro linhas e o jogo e seus personagens tem sim um impacto relevante na sociedade. 

Inquestionavelmente, o conceito de muitas pessoas sobre o que é ser homem tem uma influência forte do futebol e figuras envolvidas nesse meio. Porém, o esporte parece não acompanhar algumas importantes mudanças que estão acontecendo em relação a desconstruir posturas que são nocivas para toda a sociedade. 

Mas, algumas figuras, mesmo que sejam a minoria, desafiam o status quo e propõem algumas novas formas de agir e mostram que é possível desconstruir algumas noções ultrapassadas em relação a vários assuntos, principalmente moda. Pode-se citar o ex-jogador David Beckham como pioneiro nesse sentido e atualmente, outros jogadores de uma nova geração também tem um comportamento transgressor de um jeito positivo, como por exemplo Jackson Irvine, Jules Koundé, Hector Bellerin, entre outros. 

Jules Koundé, Hector Bellerin, David Beckham e Jackson Irvine.

Imagem: Montagem com fotos do Instagram / Reprodução