Por Flaviane Rodrigues Eugênio (@flaviane.rodrigues)*
O Planeta Futebol Feminino é um dos pilares da cobertura do futebol de mulheres no Brasil. Esta, sem dúvidas, é uma afirmação que pode ser feita sobre a iniciativa alternativa que completará 13 anos em agosto deste ano. Idealizada por Rafael Alves, comentarista e produtor de conteúdo, o PFF, como a iniciativa também é conhecida, possui ampla experiência na cobertura do futebol de mulheres e possui uma característica primordial: as notícias da modalidade feminina são dadas por quem realmente acompanha e não são realizadas apenas para cumprir tabela como em muitas outras iniciativas.
Em pesquisa de mestrado (Eugênio, 2023), ficou evidente que existe na cobertura do futebol de mulheres o que foi nomeado como um ecossistema midiático. Esta ideia partiu do pressuposto de que os sites que fazem a cobertura da modalidade feminina possuem uma característica que os diferenciam e que formam esse ecossistema da cobertura do futebol de mulheres, que juntos atuam para historicizar e popularizar a modalidade. Falando da característica do PFF dentro desse ecossistema, o PFF é a iniciativa que possui uma cobertura mais episódica, ou seja, que está centrada mais no dia a dia, e na análise dos resultados. Algo similar ao que é feito com o futebol de homens na mídia esportiva mais tradicional, contudo, em se tratando da modalidade feminina essa característica se torna essencial, visto que a modalidade ainda é negligenciada na grande mídia e muitas vezes nem os resultados das competições são divulgados.
O PFF se destaca na cobertura, porque além de cobrir os resultados das competições tanto no Brasil quanto no âmbito internacional, atua ainda suprindo a falta de notícias no jornalismo tradicional e faz isso com muita qualidade. Ao abrir a página inicial da iniciativa já se visualiza essa característica principal que a diferencia, a cobertura do dia a dia das competições, que vai da série A1 do Campeonato Brasileiro, uma das competições do futebol de mulheres no Brasil, até a Série A3, que até mesmo no futebol masculino é menos prestigiada pela mídia.

Rafael Alves, o idealizador, salienta a importância não só do PFF, como também de outras iniciativas que falam do futebol de mulheres, ressaltando que são elas que em grande medida divulgam a modalidade feminina, fazem a cobertura rotineira e criam estratégias para atrair engajamento e consequentemente o público. No entanto, para ele o jornalismo tradicional também vem se modificando para atender as demandas do futebol de mulheres e o esporte de maneira mais ampla:
Eu acho que a mídia alternativa, a mídia independente, ela tem um fator importante na história como um todo. Eu não estou falando só por ter um canal de mídia independente, falo por vários canais, poderia citar aqui vários, além do Planeta Futebol Feminino, Dibradoras, Fut das Minas, Empório Futebol Feminino. Enfim, tantos outros canais que olham para o futebol de mulheres no dia a dia, acompanham, criam linguagens para se falar, criam alternativas para se abordar e criam engajamento que é muito particular, que é engajamento da internet. E aí, nessa esteira, eu acho que a mídia também vem desenvolvendo a sua maneira de tratar o futebol de mulher e o esporte também, de um modo geral (Rafael Alves em entrevista ao Observatório Marta)
Rafael Alves não está errado em evidenciar o papel de iniciativas alternativas, ou independentes como ele menciona, para a popularização do futebol de mulheres. Assim como não está equivocado quando percebe que há mudanças, ainda que pequenas, na cobertura jornalística da mídia tradicional sobre o futebol de mulheres. Em notícia divulgada pelo Le Monde Diplomatique Brasil, que analisa dados do Observatório das transmissões de futebóis, fica evidente que há um aumento e diversidade de veículos responsáveis pelas transmissões dos campeonatos nacionais e seleções de mulheres no Brasil. Logo, pode-se dizer que sim, o futebol de mulheres está sendo mais pautado pelo jornalismo e que há uma expansão da modalidade. Se considerarmos que só a partir de 1990 o futebol de mulheres começou a ser transmitido pela televisão aberta, e mais especificamente pela Band (Castro, 2021), é possível sim considerar e, principalmente, comemorar, esse interesse midiático, sem desconsiderar, é claro, aqueles que são precursores na cobertura da modalidade e também a discrepância que ainda existe no tratamento dado ao futebol de homens e ao de mulheres pela mídia tradicional.
Falando do site do PFF, mais recentemente, foi possível observar que muitas iniciativas como o Dibradoras, site pioneiro na cobertura do futebol de mulheres, têm modificado seus formatos e atualizado cada vez menos os sites, o que não ocorreu com o PFF, que mantém as publicações no site e também nas demais redes sociais. No mês de maio, pelo menos 17 postagens foram feitas, com notícias da série A1, A2. A3, Copa do Brasil, outra competição disputada pelos times brasileiros, futebol internacional e Seleção brasileira. O podcast De primeira futebol feminino também se mantém atualizado, assim como o Youtube, que possui diversos conteúdos sendo produzidos. Por isso é possível afirmar que mesmo diante dos inúmeros desafios da cobertura da modalidade feminina, como a dificuldade de ver os jogos e a falta de apoio, o PFF não estremeceu e permanece como parte da engrenagem que movimenta o futebol de mulheres.
Além do Site, a iniciativa possui ainda páginas no Instagram, no Twitter, no Facebook e canal no Youtube, além do Podcast de Primeira que inicialmente foi pensado por Thiago Ferreira, mas passou a fazer parte do PFF e o podcast Planeta Futebol Feminino, que parou de ser atualizado em 2022, mas tanto no De Primeira, quanto no youtube as publicações se mantém ativas. Essa multiplicidade de plataformas utilizadas contribui para a diversificação de conteúdos, porque mesmo que possua como centralidade a cobertura rotineira no site, o diferencial notado no ecossistema midiático, nas demais plataformas, como nos podcasts ou no youtube, análises mais aprofundadas são realizadas, assim como entrevistas. Uma delas foi com Kim Saito, que atualmente é diretora executiva da Federação Paulista de Futebol. No episódio com a gestora, para além das análises rotineiras, questões mais profundas e estruturais do futebol de mulheres foram tematizadas. Kim inclusive ressalta em diversos momentos a dificuldade de se inserir no mercado, ou seja, nem o futebol de mulheres facilita a entrada de mulheres em cargos de gestão, mas, foi por meio de oportunidades únicas que ela conseguiu se consolidar como gestora.
Cabe destacar ainda que embora seja idealizado por Rafael Alves, as mulheres são, também, em grande medida, responsáveis pela cobertura da modalidade feminina e são elas, em maioria, que assinam as notícias sobre o dia a dia das competições e participam dos episódios do Podcast e do Youtube. A Associação para Mulheres no Esporte e na Mídia, AME, divulgou que somente 12% das notícias do esporte são produzidas por mulheres e somente 5% exercem cargos de liderança nas editorias de esporte. Já o relatório da União dos jornalistas mostra que mulheres podem receber até 25% menos que homens no jornalismo esportivo exercendo o mesmo cargo. A partir desses dados, nota-se esse espaço desigual que homens e mulheres possuem para falar de futebol, sendo assim, o PFF ser uma iniciativa com espaço para mulheres também mostra uma outra peculiaridade que o coloca importante nesse ecossistema midiático.
Muitas características poderiam ser mencionadas para falar do Planeta Futebol Feminino e da importância que a iniciativa pensada por Rafael Alves possui, seja por meio desta cobertura do dia a dia nos Sites, que é importante para ajudar a contar a história da modalidade feminina, seja por meio de análises mais profundas e mais factuais do Podcast e do Youtube. Irei me ater a dizer então que o PFF é conteúdo obrigatório para aquelas e aqueles que querem se informar sobre o futebol de mulheres e conhecê-lo em suas minúcias, a nível nacional ou a nível mundial. Além disso, enquanto a mídia tradicional caminha, a passos lentos, para dar visibilidade às mulheres no esporte, podemos dizer que o PFF sempre as valorizou e deu espaço para que diversas histórias fossem contadas.
*Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e integrante do grupo de pesquisa em Comunicação e Culturas Esportivas, o Coletivo Marta. Contato: flavianerodrigues.e@gmail.com
**Esta resenha foi produzida como atividade da disciplina COM864 Comunicação, Esporte e Gênero ofertada no PPGCOM da UFMG no semestre 1 de 2025 pela professora Ana Carolina Vimieiro.

